Crítica | “Me Atrevo a Amarte”: uma novela com identidade confusa e promessas não cumpridas

Kimberly Dos Ramos e Rodrigo Guirao em 'Me Atrevo a Amarte' (Foto: TelevisaUnivision)

Com a reta final se aproximando, Me Atrevo a Amarte, assinada pelo veterano produtor Salvador Mejía Alejandre (Fuego en la Sangre, Vivir de Amor), chega ao desfecho tentando justificar a expectativa criada em torno de mais uma grande aposta do horário das 18h30 no Las Estrellas. Anunciada como um melodrama contemporâneo com raízes na tradição rural mexicana, a novela nunca encontrou um tom claro — e isso acabou comprometendo seu impacto ao longo de toda a exibição.

A proposta inicial era promissora: unir amor, vingança, laços familiares, empoderamento feminino e o cenário bucólico do interior do México em uma narrativa emocional e culturalmente significativa. Mas a execução ficou aquém. A novela se dividiu entre o desejo de soar moderna e o apego exagerado às fórmulas mais batidas do gênero. O resultado foi um melodrama indeciso, preso entre intenções que raramente se alinharam.

O maior entrave de Me Atrevo a Amarte foi a superficialidade. Apesar dos temas densos que propôs — como independência feminina, violência estrutural e conflitos de classe — quase tudo foi abordado de forma rasa, quando não didática. Faltou ousadia no texto e na condução das cenas. O roteiro recorre a soluções fáceis, muitas vezes previsíveis, que impedem a trama de alcançar qualquer profundidade real.

A escolha do elenco também gerou ruído desde os primeiros capítulos. A escalação de atrizes com idades muito próximas para interpretar mãe e filha, por exemplo, causou estranhamento. Danna García, com apenas um ano a mais que Karyme Lozano, foi colocada no papel de matriarca da trama, sem que houvesse um esforço real de caracterização que justificasse essa diferença. A sensação foi de descuido — algo que o público percebeu e não perdoou facilmente.

Marlene Favela como a vilã Deborah em 'Me Atrevo a Amarte' (Foto: TelevisaUnivision)

A protagonista, vivida por Kimberly Dos Ramos, nunca convenceu como mulher do campo forte e determinada. A construção de sua personagem se baseia mais na aparência do que em ações ou decisões consistentes ao longo da narrativa. Sua entrega oscilou, ora soando mecânica, ora deslocada — e o sotaque forçado que tentou adotar apenas acentuou a artificialidade. Rodrigo Guirao, seu par romântico, teve carisma e presença cênica, mas tropeçou em sua limitação vocal. Faltou intensidade, especialmente em momentos de clímax que pediam emoção genuína.

Quem realmente brilhou foi Marlene Favela, no papel da vilã Déborah. Com uma presença de cena marcante, Favela trouxe energia e força a uma personagem que, apesar de seguir os estereótipos do gênero, foi humanizada por sua interpretação. Ela protagonizou os momentos mais interessantes da novela, ainda que tenha sido subaproveitada em certos arcos.

Visualmente, a novela teve acertos. As locações rurais e o cuidado com a direção de arte conseguiram criar uma ambientação rica e autêntica. Infelizmente, esse cuidado não se estendeu à narrativa. O ritmo lento e os inúmeros flashbacks tornaram a experiência cansativa nos capítulos mais recentes. A trama foi perdendo fôlego, e personagens que tinham potencial acabaram descartados ou encerrados às pressas, reforçando a sensação de falta de planejamento.

Me Atrevo a Amarte termina como um melodrama que tentou agradar a todos, mas não conquistou verdadeiramente ninguém. Nem nostálgico o suficiente para os fãs do tradicional, nem ousado o bastante para renovar o gênero, a novela de Salvador Mejía tropeçou justamente por tentar equilibrar o clássico com o contemporâneo sem uma visão clara do que queria ser.

Seu legado, portanto, deve ser o de uma produção visualmente bonita, com boas intenções, mas que se afundou em uma narrativa sem impacto. Uma novela que prometia paixão, mas entregou morno — e que dificilmente deixará saudade.

Redação

Paulista do interior, apaixonado por novelas, séries e filmes. Gamer nas horas vagas e entusiasta da cultura pop.

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