Por décadas, o SBT consolidou sua identidade em grande parte com base na exibição de novelas mexicanas. A parceria com a Televisa moldou o gosto de gerações de telespectadores e garantiu ao canal índices estáveis em faixas que hoje enfrentam um cenário de esvaziamento. Porém, o que antes era um dos ativos mais valiosos da emissora parece agora mal aproveitado, sem planejamento estratégico e cada vez mais fragilizado diante de decisões internas que comprometem sua força histórica.
A crise mais recente ocorreu com Eternamente Apaixonados, novela inédita, produzida por Silvia Cano e estrelada por Alejandra Robles Gil e Marcus Ornellas. Estreando em 9 de junho, a trama foi exibida em um horário novo e instável (17h45), sem tempo hábil para se consolidar ou atrair público. Em menos de uma semana, a novela foi retirada da grade, após apenas cinco capítulos. A reação do público foi imediata, e a imagem do SBT diante do público noveleiro voltou a ser questionada.
Cancelamentos como esse não apenas impactam a audiência momentânea, mas geram um efeito duradouro de desconfiança. O telespectador de novela acompanha a trama como parte de uma rotina. Quando a emissora interrompe uma obra sem justificativas claras e sem cumprir seu ciclo natural, quebra um pacto essencial com esse público.
Outro ponto de atenção foi a descontinuação da faixa das 13h45, até então ocupada pela reprise de Quando me Apaixono. A decisão não se deu por desempenho fraco — pelo contrário, a novela vinha garantindo bons índices, superando a média da faixa horária. O SBT, no entanto, optou por abrir espaço para a produção nacional A Caverna Encantada, que hoje ocupa duas faixas seguidas na programação, mesmo sem retorno proporcional de audiência. A substituição gerou estranhamento e reforçou a impressão de que o canal não valoriza adequadamente os produtos que entregam consistência.
Apesar disso, há sinais de que o SBT ainda aposta, ao menos parcialmente, nas mexicanas. A emissora renovou sua parceria com a Televisa até 2028 e prepara a estreia de As Filhas da Senhora Garcia no horário nobre, substituindo o fracasso infantil. Trata-se de um movimento importante: pela primeira vez em anos, uma novela mexicana inédita ocupará a faixa das 21h. É um teste relevante, mas que só terá efeito se vier acompanhado de divulgação eficiente, estabilidade na programação e uma política de exibição coerente com os hábitos do público-alvo.
Em um momento em que suas novelas infantis inéditas enfrentam desgaste e os investimentos jornalísticos não surtiram o efeito desejado, as tramas mexicanas continuam sendo uma opção viável, de baixo custo e com público fiel. O desafio do SBT não é encontrar boas novelas, mas sim decidir como e onde encaixá-las em uma grade que precisa urgentemente de estabilidade.
Se bem posicionadas, com regularidade e investimento mínimo em comunicação, as mexicanas ainda têm muito a oferecer. O que falta, por enquanto, é compromisso de longo prazo e visão estratégica. Sem isso, o risco é o SBT continuar desperdiçando um conteúdo valioso — e afastando um público que, por décadas, sempre esteve ali.
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